quarta-feira, novembro 23, 2005
The perfect storm (after the quiet)
Ante- estreia hoje o novo filme (o quarto) da saga da criança de Hogwarts.
A partir de sexta-feira, será impossível passar ao lado da histeria mediática e do frenesim da criançada.
Nos States, "Harry Potter & the goblet of fire" estreou dia 18 e, três dias depois, perfazia já 102 milhões de dólares de bilheteira, estabelecendo um novo record de bilheteira.
Mais negro, mais adulto (pela primeira vez, os miúdos com menos de 12 anos não entram sozinhos) e mais violento, o fenómeno infanto-juvenil mais importante dos últimos anos mereçe uma nova espreitadela.
Sempre estranhei o facto de, na idade do audiovisual, um fenómeno desta ordem ter tido origem em livros. E ainda por cima sem bonecos, o que me baralhava realmente as ideias. É certo e sabido que os miúdos não lêem, sobretudo calhamaços de caractéres.
O fenómeno funcionou, segundo percebi, graças a um gigantesco "word of mouth", um gigantesco boca-a-boca a nível mundial.
Omitindo os previsíveis jogos de vídeo e o habitual merchandising, o hype da prosa teve continuidade imediata no grande ecrã e potênciou a coisa a níveis nunca vistos.
Entrei sorrateiramente no fenómeno via cinema, desconfiado.
Não gostei dos dois primeiros filmes (a batalha do xadrez gigante e das aranhas parecem sequências de puro terror).
Ao terceiro, acabei por me render, mesmo com tanto flashback e flashforward. Uma piscadela de olho a outros targets, mas impossíveis de captar eficazmente por parte do público-alvo.
Mesmo contendo muito pouco (ou mesmo nada) de original, o mérito de Harry Potter é justamente esse: o de, habilmente, baralhar e dar de novo.
A minha resistência inicia advém disso mesmo, do sentir que já havia visto aquilo e por me cheirar tambem a pastiche, ou pior, engodo. E, não haja dúvidas, está lá tudo: o carocha Herbie, o mundo da feitiçaria, a saga de Oliver Twist, o cubo mágico do Hellraiser, etc. Em termos de informação, trata-se de uma obra riquíssima, embora sendo de criação dúvidosa.
E, quanto á violência inicial que me espantou, percebo que hoje ela nada tenha em comum com a da minha adolescência (a Abelha Maia, ao que saiba, não era amiga do Pokémon e as emissões de TV encerravam ás 21h com o Vitinho, quando hoje tem ínicio ás 7h com o Dragon Ball. E ainda diziam violento o Conan e a sua saga na Industria...)
Hoje-em-dia, penso assim mas um miúdo de 10 anos, em 2000, não.
E se em apenas duas horas se consegue que uma criança tenha acesso a todo o meu imaginário - construido ao longo de 30 anos e condensado aqui em 120 mns, isto quer dizer que ela vai obrigatoriamente sonhar mais alto que eu, que o seu patamar de exigência será mais elevado e que o sua criatividade conhecerá muito poucos limites.
Este é um feito gigantesco.
Por isto, e só por isto, há que reconhecer o mérito e tirar o chapéu a Harry Potter.